DIA DO GOLEIRO





*Marcelo Valmor

Quando era criança, o goleiro representava para todos nós, meninos, o anti-herói, aquele que evitava o momento maior do futebol que era o gol. E o herói nesse personagem simplesmente não existia. Quando fazia uma defesa espetacular não cumpria mais do que sua obrigação. Bons tempos esses quando o goleiro só era escolhido em peladas na rua por último. Os atacantes eram sempre os primeiros. Os goleiros eram os piores, e os piores se resignavam com sua sina e tentavam não ficar de fora da partida e dos amigos pegando no gol.
Uma das brincadeiras que fazíamos para saber quem tinha vocação para o gol era o de pegar a bola e jogar na altura do peito de um dos amigos. Se agarrasse estava identificado. Sofreria seus dias na terra como aquele que não tinha talento para a linha, como se chamava na época quem jogava fora das três traves. Mas se matasse no peito e saísse jogando, ah, isso sim seria um jogador. Era o famoso teste da bola.
Mas o tempo passou e o conceito de goleiro como o antigol foi mudando. Depois dos goleiros da década de 1950 e 1960, surgiram os goleiros galãs. Raúl, do Cruzeiro, foi o pioneiro. Daí em diante a coisa virou moda. Mas não foram suficientes para alterar a imagem do anti herói que os goleiros eternizaram. Agradavam as mulheres, decerto, mas numa sociedade machista, elas próprias sucumbiram diante da mais absoluta falta de talento desses guardadores de meta.
Apesar de alguns deles terem qualidade, a contribuição que deram para retirar o goleiro debaixo do pau foi a exposição na mídia. Se os goleiros galãs contentavam em ser tietados, dando autógrafos e enlouquecendo as mulheres, os goleiros feiosos não tinham nenhuma possibilidade de estar na mídia a não ser que se destacassem como artilheiros. Nascia, assim, o falso atacante, como o falso lombo e tudo que vem do Paraguai do bispo.
O paraguaio Chilavert foi o pioneiro ao abandonar as traves para se aventurar a fazer aquilo que mais sofria: gols. E o fez muito bem. Sua marca passou dos cinqüenta, e na sua esteira começaram a surgir os Rogérios Cenis da vida, até chegarmos a Bruno, ex Atlético e hoje no time do Flamengo, do Rio de Janeiro.
Não obstante aqueles que não conseguiram desenvolver técnicas para a cobrança de falta e de pênalti, alguns simplesmente abandonam a meta para se aventurarem na área adversária. E o desejo de vingança contra os atacantes é tão grande que recentemente Marcos, goleiro do Palmeiras, faltando mais de vinte minutos para acabar o jogo, despencou na área adversária e quase colocou o seu time, que perdia por um a zero, em situação ainda mais desconfortável.
É compreensível todo esse drama que o goleiro carrega. Quando não está buscando a bola no fundo das suas redes, está a fazer que o seu colega a busque dentro do próprio gol. Mas como o momento do goleiro é fugaz, surge sempre para ele a possibilidade de se tornar capitão, enveredar-se pela política ou posar para revistas masculinas.
Apesar de todo o avanço na carreira, parece que o goleiro continua não matando a bola no peito.

*Professor

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